Confira abaixo o artigo escrito por Esther Pillar Grossi, doutora em Psicologia da Inteligência pela Universidade de Paris, publicado no jornal Zero Hora de 16 de outubro de 2012.
A aprendizagem é um fenômeno social. Esta descoberta, que foi primeiramente apontada por Vygotski, e depois amplamente aprofundada por Wallon - médico francês contemporâneo de Piaget - muda radicalmente o olhar do consenso histórico de que aprender é um fato individual.
E ela tem consequências práticas profundas.
Em primeiro lugar, a sala de aula deve ter novíssima estética. Adeus à cena escolar das filas de alunos, um atrás do outro, voltados para o professor postado na frente deles, explicando-lhes e escrevendo no quadro para que copiem.
As trocas entre os alunos ocupam um espaço importante, inclusive porque “há momentos em que um bom professor pode prestar um péssimo serviço aos alunos”. Esta afirmação é de Jean Piaget, o grande responsável pela descoberta de que entre as experiências e os conhecimentos existe uma construção, o que deu nascimento à teoria denominada Construtivismo.
A importância das trocas entre alunos se assenta no fato de que se aprende na interlocução com três grupos de pessoas _ os que sabem mais, os que sabem o mesmo e os que sabem menos do que aqueles que aprendem. Até hoje, somente foi valorizada e operacionalizada a aprendizagem com quem sabe mais que os alunos, isto é, com os professores. Portanto, entre os alunos deve reinar o silêncio, para que eles possam escutar devidamente a professora. O silêncio dos alunos é uma condição imperativa na escola que aí está, pois se parte do princípio de que quem ensina é o (a) professor (a). Quando se descobre que Piaget está cheio de razão ao nos alertar de que há momentos e muitos em que se aprende mais com iguais do que com superiores, há que se dar uma reviravolta na estruturação da escola.
Outrossim, esta reviravolta não concerne somente à sala de aula. Ela abarca a escola como um todo. Como “só ensina quem aprende”, o corpo docente tem também que estruturar-se calcado no grupal e não no individual. E um grupo tem prerrogativas próprias para que seja operativo. O grupo precisa ser estável e precisa de coordenação, porque “não há grupo sem coordenação”, como bem lembrou Madalena Freire.
O corpo docente de uma escola precisa ter as riquezas de um grupo estruturado. Um grupo só é estruturado se ele é estável e bem coordenado. Uma escola sem a consciência e a consistência de que seus professores e funcionários agem como parte de um grupo, e não como uma peça isolada numa engrenagem meramente técnica ou administrativa, é um arremedo de escola e nela pouco se ensinará e, portanto, pouco se aprenderá.
É inadmissível que os professores e funcionários de uma escola não tenham senão apego a ela porque ela é próxima de suas residências ou por outras razões que não a da concretização de que, como um corpo, nela produzem aprendizagem para seus alunos.
É, portanto, fora de propósito que se aceite uma movimentação de seus professores sem nenhuma razão profissional, ou seja, sem algo voltado para os objetivos ensinantes de uma escola.
Além disso, como grupo só existe com coordenação, ele só existirá com alguém que articule as autorias de quem dele participa. A coordenação é tanto mais necessária quanto mais os agrupados são autores, isto é, são criativos face às tarefas pelas quais cada grupo é responsável no contexto em que atua.
Pois, muito especialmente uma escola verdadeira só ensina se há invenção por parte de seus professores, uma vez que o processo de aprendizagem dos alunos é eminentemente singular e surpreendente, para o qual a criatividade é pedra fundamental.
Assim, há que se ter, portanto, coragem de remexer nas entranhas das escolas, a fim de que elas acompanhem os mais consistentes e atualizados achados das ciências do aprender - o de que as aprendizagens acontecem grupalmente, o que fez consolidar-se uma nova teorização sobre a aquisição dos conhecimentos - o pós-construtivismo.
Incorporar às escolas a dimensão social da sua estruturação é uma das chaves da possibilidade de reverter a catástrofe das poucas aprendizagens, evidenciadas em todas as avaliações a que elas são submetidas, nacional e internacionalmente.
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